Consumo de Energia
Poucos estudos avaliaram o efetivo consumo de energia no setor de HIS no Brasil por meio de monitoramento. Apesar disso, a aplicação de estratégias de eficiência energética em HIS social é um tópico apontado como relevante para a transição energética, uma vez que é esperado o aumento do consumo energético por esta parcela da população (IEA, 2020). Uma vez que o consumo residencial de energia no Brasil se eleva principalmente devido ao aumento do número de residências e do acesso dos habitantes à utensílios, caso se espere um incremento na transferência de renda, deve-se esperar que o consumo residencial brasileiro aumente (ACHÃO E SCHAEFFER, 2009).
O estudo de Simões e Leder (2022) destacou que os principais fatores associados ao aumento do consumo de energia em HIS são: expansão da área construída, número de ocupantes, quantidade de equipamentos, estação (famílias consomem mais no verão), e composição familiar. Na sua pesquisa, cerca de metade das UHs consumia até 100 kWh/mês cada, e mais da metade (65%) usufruiu do desconto de tarifa social para energia elétrica. A principal conclusão foi que cerca de 37,6% da amostra de população pesquisada é população em situação de vulnerabilidade econômica, mas apresenta um consumo de energia similar à população em situação de não vulnerabilidade.
Este fato abre discussão para a questão da pobreza energética: a falta de acesso à serviços energéticos. Ou seja, refere-se à situação da população em que o conforto, saúde ou bem-estar é afetado negativamente pelo baixo consumo de energia. Por exemplo, falta de acesso à condicionamento de ar ou ventiladores em situação de calor excessivo, ou falta de aquecimento de ambientes em frio excessivo. A pobreza energética está totalmente relacionada com a pobreza econômica, pois muitas vezes os indivíduos evitam o uso de equipamentos devido ao custo da fatura de energia.
Nesse sentido, um dos aspectos relevantes é que geralmente os beneficiários da faixa 1 do PMCMV advém de habitações precárias e áreas de risco - onde a água e energia são consumidas sem custo ou sem formalização (BRASIL, 2014). Em casos em que os beneficiários advêm de lugares com aluguel da moradia, ocorre uma compensação com redução do custo de vida advinda da queda nas despesas com aluguel, mas aumento do custo com água, luz e condomínio. Segundo o IPEA (2014), há um aumento percebido no custo de vida dos moradores nas habitações de interesse social assim que se mudam, relativo ao custo com energia elétrica. Este aumento chega a ser de 11,3% em média no Brasil, mas varia de região para região, sendo aproximadamente 9,9% na região Norte, 9,0% na região Nordeste, 12,4% na região Sudeste, 14,2% na região Sul e 12,6% na região Centro-Oeste.
Dessa forma, é importante considerar que a redução do consumo de energia em HIS é fundamental, pois o custo do uso de energia para esta população é significativo.
O estudo da evolução normativa do programa PMCMV (ISSA et al., 2019), em relação à eficiência energética e conforto ambiental objetivou traçar um panorama da evolução ao longo do tempo, identificando os acertos e dificuldades na implementação desses aspectos, e propondo melhorias iniciais . Dos diversos pontos avaliados na época, apenas a área mínima é um requisito considerado como adequado. Apesar de o estudo ter apontado que os requisitos relativos à eficiência energética, como sombreamento, ventilação, orientação e abertura das janelas, poderiam ser mais efetivos, atualmente estes critérios foram contemplados na Portaria MCID Nº 725, de 15 de junho de 2023. O estudo apontou que havia um movimento das normativas em direção à implementação de energias renováveis nos empreendimentos, o que de fato aconteceu com a Portaria Nº 532 de 23 de fevereiro de 2022 e posteriormente, com a Portaria MCID Nº 725, de 15 de junho de 2023.
Na mesma linha, o estudo desenvolvido pelo LabEEE (LAMBERTS et al., 2021), também no âmbito do programa EEDUS, objetivou analisar a relação custo-benefício da inclusão de parâmetros de eficiência energética em HIS. Como resultados, foram definidos casos otimizados para 3 tipologias: unifamiliar, geminada e multifamiliar, considerando diferentes medidas de eficiência energética relacionadas à combinações de parede, cobertura,esquadrias e mudança de pé-direito, com consideração do entorno. Como resultados do estudo, foi desenvolvido um conjunto de diretrizes otimizadas para a envoltória de edificações para cada zona bioclimática brasileira, o que resultou em uma cartilha para cada zona considerando as tipologias unifamiliar e multifamiliar. A otimização levou em consideração os indicadores de desempenho da NBR 15575:2021 e (percentual de horas numa faixa de temperatura operativa considerada em conforto (PHFT) e carga térmica) e a minimização do custo ao longo da vida útil da edificação. Apesar de o estudo tratar de eficiência energética no âmbito do melhor desempenho da envoltória, as análises consideraram a carga térmica como parâmetro de decisão, e o consumo de energia, quando avaliado, foi obtido por meio da razão da carga térmica e do coeficiente de performance (COP) de um equipamento de ar-condicionado padrão (considerado o valor de referência da INI-R de 3,5 W/W).
Bridi et al. (2020) revisaram diversos estudos focados na redução do consumo de energia em HIS no mundo. Adotando o modelo da habitação como living labs, os autores perceberam que entender as características existentes, bem como os hábitos de uso, foram prerrogativas nos estudos que visam reduzir o consumo de energia em habitações de interesse social. Geraldi et. al (2022) elaboraram benchmarks de consumo energético para o setor residencial. Neste estudo, foi possível verificar o consumo anual de energia elétrica típico para uma unidade habitacional para cada região do Brasil, para tarifa comum e tarifa baixa renda (Tabela 4).
Tabela 4 - Benchmarks de consumo energético de baixa renda por região do Brasil.
Região | Consumo médio anual (kWh/UH.ano) |
---|---|
Norte | 1.232,9 |
Nordeste | 1.070,7 |
Centro-Oeste | 1.649,2 |
Sudeste | 1.843,9 |
Sul | 1.816,1 |
Média nacional | 1.522,6 |
Fonte: Geraldi et al. (2022).
Com relação ao consumo de energia por uso final, há um predomínio de consumo com equipamentos das categorias conforto ambiental, aquecimento de água e conservação de alimentos variando entre 82% e 91% em função da região geográfica (ABRAHÃO E SOUZA, 2021).
Há poucos trabalhos na literatura que analisaram especificamente o uso final de energia em HIS . Um dos mais proeminentes foi o Projeto “Uso racional de água e eficiência energética em habitações de interesse social”, desenvolvido pelo LabEEE (GHISI et al., 2015). Neste projeto, cerca de 103 habitações de interesse social foram monitoradas por 3 anos em Florianópolis, e pode-se estabelecer o perfil de consumo das unidades habitacionais. A Tabela 5 apresenta o perfil de consumo por usos finais da amostra.
Tabela 5 - Usos finais de eletricidade (Percentual do consumo total).
Uso final | Superior (%) | Mediana (%) | Inferior (%) |
---|---|---|---|
Chuveiro Elétrico | 40,3 | 36,8 | 33,5 |
Refrigeradores | 33,1 | 29,9 | 27,4 |
Televisão | 12,2 | 10,2 | 8,4 |
Iluminação | 6,1 | 5,2 | 4,5 |
Máquina de lavar-roupas | 1,1 | 0,9 | 0,7 |
Microondas | 0,9 | 0,6 | 0,4 |
Outros | 13,5 | 10,5 | 8,0 |
Fonte: Ghisi et al. (2015) e NBR 15575-11:2021.
É importante considerar que estes resultados são apenas para a região de Florianópolis. Sendo assim, usos finais diferentes podem existir considerando outras características climáticas e culturais. Por exemplo, em climas mais quentes (como nas regiões Norte e Nordeste), o uso final por chuveiro elétrico pode ser muito menor. Além disso, os dados da pesquisa são de 2015, e a aquisição de equipamentos de ar-condicionado vêm crescendo nas habitações de interesse social nos últimos anos (ABRAHÃO E SOUZA, 2021). Isso é reforçado pelos dados da Pesquisa de Posses e Hábitos (PPH, 2019), que conduziu investigações sobre o uso de equipamentos para habitações de baixa renda. Apesar de não ser exatamente o mesmo grupo de pesquisa (habitações de interesse social e baixa renda), pode-se ter uma inferência por associação, uma vez que é muito provável que a população que vive em habitações de interesse social se inclui como população em situação de baixa renda. Neste caso, o PPH 2019 relata cerca de 4,6% de ar-condicionado nos usos finais médios do Brasil, considerando as Classes D-E (Figura 23).
As cargas de tomada (equipamentos) e iluminação representam uma parcela significativa do consumo de energia de residências. A Tabela 6 apresenta a densidade de potência média instalada com equipamentos e iluminação levantadas de por meio do projeto Uso racional de água e eficiência energética em habitações de interesse social (GHISI et al., 2015).
Tabela 6 - Densidade de potência média instalada.
Tipo de potência | Faixa | Sala | Dormitório | Cozinha |
---|---|---|---|---|
Equipamentos (W/m²) | Limite inferior | 12,51 | 10,21 | 59,30 |
Média | 19,31 | 18,28 | 71,90 | |
Limite superior | 26,10 | 26,36 | 84,00 | |
Ref NBR 15575 | 120,00¹ | 0,00 | 0,00 | |
Iluminação (W/m²) | Limite inferior | 1,62 | 3,35 | 2,16 |
Média | 2,01 | 3,82 | 2,59 | |
Limite superior | 2,40 | 4,30 | 3,03 | |
Ref NBR 15575 | 5,00 | 5,00 | 5,00 |
Fonte: Ghisi et al. (2015) e NBR 15575-11:2021.
¹ Neste caso, a NBR 15575 aplicar um valor de Potência Instalada total, não por m².
É possível verificar que os ambientes possuem baixa densidade de potência de Iluminação (DPI) se comparada com os valores de referência da NBR 15.575-11:2021. Quanto aos ambientes de dormitório e sala, os valores obtidos pela pesquisa divergem dos valores de Densidade de Potência de Equipamentos (DPE) da norma, pois a norma considera um valor fixo de 120 W para a Sala e nenhuma potência para o dormitório.
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